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MOÇÃO DE REPÚDIO AOS ACONTECIMENTOS SISTÊMICOS  QUE IMPOSSIBILITAM PESSOAS NEGRAS DE ASSUMIREM CARGOS EM UNIVERSIDADES E À ANULAÇÃO DO CONCURSO QUE APROVOU A PROFESSORA ÉRICA CRISTINA BISPO NA USP

Atualizado: 25 de out.

MOÇÃO DE REPÚDIO AOS ACONTECIMENTOS SISTÊMICOS  QUE IMPOSSIBILITAM PESSOAS NEGRAS DE ASSUMIREM CARGOS EM UNIVERSIDADES E À ANULAÇÃO DO CONCURSO QUE APROVOU A PROFESSORA ÉRICA CRISTINA BISPO NA USP
MOÇÃO DE REPÚDIO AOS ACONTECIMENTOS SISTÊMICOS  QUE IMPOSSIBILITAM PESSOAS NEGRAS DE ASSUMIREM CARGOS EM UNIVERSIDADES E À ANULAÇÃO DO CONCURSO QUE APROVOU A PROFESSORA ÉRICA CRISTINA BISPO NA USP



O Instituto de Filosofia Africana (IFA), e as instituições, grupos de pesquisa, entidades acadêmicas, movimentos sociais e demais organizações abaixo-assinadas, vêm a público repudiar a anulação do concurso público que aprovou, em primeiro lugar, a professora Érica Cristina Bispo para a docência na área de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa na Universidade de São Paulo (USP), e exigir a imediata reparação do dano causado à candidata e ao interesse público. Assim como propor ações antirracistas que garantam às pessoas negras a segurança de assumir seus cargos para futuros concursos.


Contexto e fatos relevantes 

O âmbito universitário como presente nas relações sociais, permeadas por articulações de poder, invariavelmente é influenciado pela manutenção daquilo que Cida Bento notifica como “pacto narcísico da branquitude”. O ingresso como docente universitário ainda é percebido como mantenedor desses elos da branquitude e, para tanto, as artimanhas são feitas quando se percebe a entrada de grupos racializados como não-brancos. Não é de espantar que ouvimos relatos de pessoas concursantes ou compondo bancas de presenciar ações para impedir a mudança no status quo, inclusive  quando a pessoa racializada almeja entrar na instituição de ensino que faz parte do elitismo acadêmico. Nesse momento ela é vista como ruptura da normalidade da ordem do conhecimento e, portanto, a branquitude precisa descobrir vias que impeçam sua entrada e contamine tal organização.

Nesse cenário, está o caso da professora Érica Cristina Bispo. O concurso ocorreu entre 17 e 21 de junho de 2024 para a área de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa na FFLCH/USP. A professora Érica Bispo foi aprovada em primeiro lugar; um detalhe relevante: ela era a única candidata negra entre os participantes. 

Após recursos apresentados por seis candidatos brancos, que alegaram desde “baixa produção” até suspeição da banca por suposta “proximidade” (com base em fotos de eventos acadêmicos), a Procuradoria Acadêmica e o Conselho Universitário decidiram anular o certame — apesar de instâncias internas da FFLCH terem rejeitado os recursos e confirmado o resultado. Em 30 de setembro de 2025, a USP publicou novo edital para a mesma vaga, enquanto o caso segue judicializado, o que agrava a lesão a direitos e à confiança institucional. 

Em entrevistas e manifestações públicas, a professora Érica Bispo aponta racismo institucional e perseguição, destacando seus 20 anos de carreira e a regularidade do processo seletivo até a intervenção superior. Vale perguntar: quantos concursos, em toda a história da USP, tiveram a aprovação de uma pessoa branca anulada sob alegações semelhantes?


Por que é racismo institucional?

Aqui é interessante lembrar que o percentual de pessoas negras em cargos considerados elevados e importantes é pequeno, mesmo o grupo sendo a maioria no país. O racismo institucional nos impede de ascender profissionalmente e nos delega um lugar específico na sociedade em ambiente profissional. Esse ambiente profissional em que somos agrupados, nos possibilita, geralmente, menos conforto, menos possibilidade de gozar de um bem viver e de produzir algo para além do que nós ocupamos. Assim, o racismo nos mantém em lugares que a sociedade considera subalternos, enquanto protege os lugares que os grupos privilegiados consideram de importância para manter sua posição, ao mesmo tempo que compactuam silenciosamente e estrategicamente entre si para impossibilitar nossa ascensão. O que vem se mostrando com os impedimentos de assunção ou permanência de pessoas negras em ambientes profissionais de considerado prestígio intelectual e melhor conforto ou remuneração.

No caso da professora Érica, o padrão fático é que ela era a única candidata negra aprovada, seguida de anulação com base em “proximidade” derivada de interações acadêmicas normais — não se sustenta como critério objetivo de nulidade e reproduz vieses raciais historicamente identificados nos concursos docentes. O caso se soma a denúncias públicas de entidades e coletivos (incluindo docentes da própria USP) que identificam discriminação estrutural no tratamento do mérito acadêmico de pesquisadoras e pesquisadores negros. 


Nossas exigências

  1. Restabelecimento imediato do resultado do concurso e posse da professora Érica Bispo, preservando a decisão de mérito da banca e da unidade.

  2. Transparência processual plena: divulgação integral (com dados sensíveis protegidos) dos autos administrativos e pareceres que fundamentaram a anulação.

  3. Apuração independente (com participação de órgãos de controle interno e externo e comitês de equidade) sobre racismo institucional no caso, com responsabilização quando cabível. 

  4. Revisão das regras de impedimento/suspeição em concursos, para que interações acadêmicas ordinárias (eventos, fotos, redes profissionais, confraternizações) não sejam instrumentalizadas como pretexto de nulidade, salvo prova robusta de parcialidade.

  5. Política antirracista vinculante nos concursos docentes: formação da banca, critérios e pesos publicados e auditáveis; registro público de todas as etapas; monitoramento de equidade por comissões de diversidade da universidade, alinhado ao Estatuto da Igualdade Racial e aos princípios constitucionais da isonomia e do acesso impessoal ao serviço público.

  6. Reparação simbólica e material à candidata pelos danos objetivos e subjetivos decorrentes da anulação injustificada, nos termos da legislação aplicável.

  7. Compromisso de treinamento e sensibilização de bancas e comissões avaliadoras sobre racismo estrutural, viés implícito e critérios de mérito em contextos de diversidade racial.


Compromisso público

Por fim, chamamos a atenção para o fato de que este não é apenas um episódio pontual: trata-se de mais um passo de um processo sistêmico que busca minar o pleno acesso das pessoas negras aos concursos públicos, uma das muitas estratégias contemporâneas contra as cotas e ações afirmativas. É preciso que se perceba o padrão — e não apenas o acidente — para que não se repita.

As entidades signatárias reafirmam seu compromisso com a Lei 10.639/03, com a promoção da equidade racial na educação superior e com a proteção do mérito acadêmico frente a práticas que deslegitimam trajetórias negras. Não aceitaremos que a excelência acadêmica negra seja anulada por critérios frágeis e enviesados. Exigimos justiça — rápida, transparente e efetiva.


Assinam:

Instituto de Filosofia Africana no Brasil (IFA)

Grupo de pesquisa África-Brasil/Unilab

Latitudes Africanas/Unilab

Grupo de Pesquisa Afroperspectivas, Saberes e Infâncias (Afrosin)

Mulungu: leituras contracoloniais - UERJ

Ajeum Filosófico

Núcleo de Pesquisa em Estética e Filosofia da Arte Africana - UFRRJ

Grupo de Pesquisa Oniruúrú-África, Islã e Estudos Anticoloniais.  UFES.

Divisão Internacional Garveysta

Centro de Formação e Pesquisa em Culturas Populares - SE

Pensar em Ginga- projeto de pesquisa e extensão em educação e descolonização- FEBF/UERJ 

Odus do Ser-tão: Filosofias Africanas, Ancestralidade, Encantamento e Saberes Afrorreferenciados / UFRRJ

Grupo de Pesquisa Africanidades, Imaginário e Educação - UFJF

Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas do Colégio Pedro II - NeabiCp2

Direito e Africanidades - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Justiça, Pensamento Africano e Afro-Brasileiro - UNEB

SANKOFA: Negritudes, Pan-Africanismo, Interculturalidades e Subalternidades (UNEB)

NACE- Núcleo das Africanidades Cearense (FACED-UFC)


_ O IFA é a união dos filósofos e filósofas negras da filosofia africana e afrodiaspórica no Brasil.


 
 
 

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Imagem do cabeçalho: Mulher carregando uma cabaça na cabeça  e com duas crianças - (Arugbá). Madeira, uáji, pigmentos outros. Século XIX.

Arte Iorubá atribuída a Kobi Ogun Kakeye d'Òràngun-Ìlá.

Museu de Arte, Foudation for the Arts Collection, Gift of Mr. and Mrs. Atanley. Dallas, EUA. Fonte: Babatunde Lawal. 

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